Módulo III - CSA Empatia
Competências
A palavra competência, etimologicamente, tem a mesma origem de “competição” e, por esse motivo, há distorções na compreensão e resistência do seu uso no contexto educacional. Contudo, Perrenoud [1] estudioso da obra de Piaget, coloca uma visão construtivista ao termo por acreditar que a mesma está vinculada à formação integral e ao desenvolvimento do indivíduo.
O termo competência é compreendido como a reunião ou o conjunto de condições, recursos e elementos disponíveis ao indivíduo para serem aplicados em determinada situação [2][3]. Assim, define-se competência como sendo um conjunto de elementos compostos por Conhecimentos, Habilidades e Atitudes (CHA). O conhecimento é o elemento que corresponde ao saber do indivíduo sobre uma determinada situação ou um problema. A habilidade refere-se a esquemas já construídos e aplicados nas situações do dia-a-dia do sujeito e, portanto, não exige novas reflexões. Está associada ao saber fazer ou à capacidade adquirida para aplicação de procedimentos, técnicas e metodologias. Já a atitude considera os valores e crenças para a tomada de posição e de decisão sobre como, quando e de que forma se manifesta, pensa ou age para responder sobre algo ou determinada situação. É através da atitude que o indivíduo decide qual a melhor ação, modos de enfrentar um problema e de como superá-lo. Desse forma, esse elemento está relacionado ao saber ser em que as motivações, as intenções, as vontades, os desejos e os sentimentos do indivíduo são respeitados no momento da ação.
Em seu livro “Competências na Educação a Distância”, Behar [2] aponta a importância das "competências e suas relações com a educação a distância”, principalmente no Ensino Superior, classificando-as sob quatro domínios. As competências definidas no domínio tecnológico estão relacionadas ao uso dos recursos digitais que dão suporte aos processos de ensino e aprendizagem na modalidade distância, a saber: os ambientes virtuais de aprendizagem, os objetos de aprendizagem, os recursos educacionais abertos, os sistemas para videoaulas e aplicativos em geral. No domínio sociocultural, as competências se referem aos aspectos sociais e culturais nos quais o sujeito está inserido. O domínio cognitivo é responsável pelas competências pautadas na aprendizagem e na coordenação de ações para a construção do conhecimento. Já as competências no domínio da gestão estão relacionadas às atividades de nível administrativo e acadêmico, através da organização de tempo e do planejamento das questões gerenciais e das prátricas pedagógicas por parte de docentes e tutores.
Mais tarde, Behar, Machado e Longhi [4] introduziram o domínio socioafetivo no estudo das competências. Neste domínio, as competências socioafetivas estão vinculadas ao ser social e afetivo nas relações desenvolvidas nos ambientes virtuais de aprendizagem. Esses dois aspectos são estudados sob a ótica piagetiana em referência às interações sociais [5] e schererniana (ver seção anterior) quanto à definição dos fenômenos afetivos [6].
Assim, o conceito de competência socioafetiva (CSA) é reconhecido como um termo “guarda-chuva” que inclui as competências sociais, emocionais e socioemocionais. A competência social, envolve a capacidade de avaliar situações sociais, determinar o que é esperado ou exigido e de selecionar os comportamentos sociais mais adequados a um determinado contexto. Já a competência emocional, termo sugerido por Saarni [7], é a capacidade do indivíduo atingir seus objetivos, refletindo valores e crenças, respondendo emocionalmente com o intuito de negociar suas relações nas trocas interindividuais e regular suas experiências emocionais.
Os estudos sobre os dois termos ajudaram a fundamentar o conceito de competência socioemocional. Ou seja, o indivíduo adquire e aplica os conhecimentos, habilidades e atitudes (CHA) para desenvolver uma identidade saudável, gerir emoções e atingir objetivos pessoais e coletivos, sentir e mostrar empatia pelos outros, estabelecer e manter relações de apoio e tomar decisões responsáveis e solidárias [8]. Ela é também reconhecida como uma "competência transversal", “competência não cognitiva”, "competência do século XXI” ou “soft skills”.
Em vista disso, é preciso compreender os aspectos sociais, emocionais e afetivos envolvidos nas relações humanas para determinar o uso de um termo ou outro. Este material não tem a pretensão de detalhar condições sociais e fenômenos afetivos associados nos processos de ensino e aprendizagem. Tampouco, proclamar que o termo a ser defendido nas questões educacionais é competência socioafetiva em vez de competência socioemocional. Os estudos aqui apresentados procuram chamar atenção à indissociabilidade desses aspectos na construção do conhecimento. A aquisição da prática de analisar as emoções em si e nos outros está associada à capacidade de observar, em si e no outro, as vivências emocionais que permeiam as relações sociais, de realizar (meta)reflexões sobre elas, de assimilar e acomodar o conhecimento apreendido e decidir sobre a necessidade de alterar suas emoções, estados de ânimo e/ou sentimentos sobre suas experiências. Desse modo, para compreender a definição da CSA utilizada neste trabalho é importante, inicialmente, entender o conceito de emoção e a diferença entre outros fenômenos afetivos.
A figura abaixo ilustra o entrelaçamento dos tipos de competências relacionadas ao tratamento das questões sociais e afetivas.
[1] PERRENOUD. P. (1999) Construir as Competências desde a Escola. Porto Alegre: Artmed.
[2] BEHAR, P. A. (2013) Competências em Educação a Distância. Porto Alegre, RS: Penso.
[3] CEZAR, V. L.; ARAUJO, R. S.; LANES, M. A.; GUIZZO, M. A. R.; AKAZAKI, J. M.; TOREZZAN, C. A.; BEHAR, P. B; WIVES, L. K. (2021) Sistemas de Recomendação Educacional baseados em Competências: uma revisão sistemática da literatura. Revista Novas Tecnologias na Educação, Porto Alegre, v. 18, n. 2, p. 521–530. DOI: 10.22456/1679-1916.110292.
[4] BEHAR, P. A.; MACHADO, L. R.; LONGHI, M. T. (2022) Competências socioafetivas em ambientes virtuais de aprendizagem: uma discussão do conceito. Revista Novas Tecnologias na Educação, Porto Alegre, v. 20, n. 1, p. 389–398. DOI: 10.22456/1679-1916.126686.
[5] PIAGET, J. (1973) Estudos Sociológicos. Rio de Janeiro, RJ: Forense.
[6] SCHERER, K. (2005) What are emotions? And how can they be measured? Social Science Information, v. 44, n. 4, p.695–729.
[7] SAARNI, C. (2002) Competência emocional: uma perspectiva evolutiva. In: BARON, R.; PARKER, J. D. A. (Org.). (Trad. Costa, R. C.). Manual da Inteligência Emocional Teoria e aplicação em casa, na escola e no trabalho. Porto Alegre: Artes Médicas. p. 65-80.
[8] CASEL (2020) CASEL’S SEL Framework: What Are the Core Competence Areas and Where Are They Promoted?. On-line.