Construindo o senso de COMUNIDADE

Ao desenvolver o conceito "comunidade" no Dicionário do Pensamento Social no século XX, Shore (1996, p. 115-7) destaca a diversidade de sentidos atribuída à palavra e as conotações emotivas que ela evoca, de "inteireza, coesão, comunhão, interesse público e tudo que é bom". Atribui a Tönnies (1887, apud Shore, 1996) a distinção entre Gemeinschaft, "a comunidade integrada, pré-industrial, em pequena escala, baseada em parentesco, amizade e vizinhança, em que as relações sociais são íntimas, duradouras e multiintegradas", e a sua contrapartida, a não-comunidade, ou Gesellschaft (associação), "simbolizando os laços impessoais, anônimos, contratuais e amorais característicos da sociedade industrial moderna". Utilizado como um tipo ideal em um continuun, comunidade contrasta a coesão emocional e a "vida boa" da comunidade tradicional, com o anonimato, o isolamento e a alienação da sociedade de massa. Shore (op. cit.) enfatiza : "o que une uma comunidade não é a sua estrutura, mas um estado de espírito, um sentimento de comunidade". A dicotomia comunidade-associação pode estar relacionada com as contrastantes concepções políticas de sociedade: "um coletivo que é mais do que a soma das partes, um corpo edificante através do qual é possível concretizar a autêntica cidadania" (visão socialista/rousseauniana) ou "uma livre associação de indivíduos em competição" (visão liberal/hobbesiana).

Para Cohen (1985, apud Shore, 1996), "comunidade é uma entidade simbólica, sem parâmetros fixos, pois existe em relação e oposição a outras comunidades observadas; um sistema de valores e um código de moral que proporcionam a seus membros um senso de identidade". A identidade é, de acordo com Marshall (1997, p. 204), "o princípio mais fundamental em todos os sistemas auto-organizáveis", por: abranger o significado, o propósito e a intencionalidade da organização; fornecer um esquema referencial constante para a renovação e a integridade organizacionais; e proporcionar a coerência em torno da qual o sistema atinge o equilíbrio dinâmico. Marshall (1997, p. 195-206) elenca como condições sine qua non para a criação de comunidades vigorosas centradas no aprendizado para o século XXI, além da identidade, a informação e as relações. "A informação é simultaneamente o meio para troca do aprendizado organizacional gerativo e sua fonte de energia"; constitui o centro dinâmico dos sistemas auto-organizáveis, permitindo o crescimento contínuo e definindo os pontos essenciais para a sustentabilidade da comunidade. "As relações representam a rede neural" que faz com que os membros sintam-se ligados à comunidade, identifiquem-se com os propósitos comuns e utilizem as informações para crescer.

Ao preconizar que "construir comunidade é uma estratégia central para compartilhar, entre todos os membros, os encargos e os benefícios da mudança e da troca", Brown & Isaacs (1997, p. 478-487) destacam que durante milênios as comunidades têm sido os mecanismos mais poderosos para criar cooperação humana e interdependência confiável. Para assegurar a sustentabilidade da comunidade a longo prazo, ajudando a eliminar a "artrite" organizacional e o "endurecimento" dos profissionais, identificam seis processos centrais:

    1. capacidade para renovar a si mesmas e reinventar o seu futuro, encorajando o aprendizado e a melhoria dos membros como um empreendimento coletivo;
    2. compromisso das pessoas por constituírem parte ativa da experiência de criar algo que elas valorizam juntas;
    3. contribuição, oportunizada pela valorização da diversidade dos talentos dos membros da comunidade;
    4. continuidade, com a tecnologia apoiando a formação de uma base de conhecimento comum, que a comunidade pode usar durante anos;
    5. colaboração, pelo desenvolvimento da interdependência confiável, compartilhando informações acerca dos progressos alcançados, dentro um processo colaborativo contínuo;
    6. consciência, encontrando modos de incorporar e invocar princípios norteadores, ética e valores tais como serviço, confiança e respeito mútuo.

Em Novas competências para um novo mundo, Somerville & Mroz (1997, p. 84-97) propõe o desenvolvimento das seguintes competências para as "comunidades de interesses em evolução":

 

compromisso com um propósito superior,

incutir a liderança responsável,

estimular a formação de equipes multidisciplinares,

estabelecer parcerias orgânicas,

favorecer a procura global,

adotar a mudança e

promover redes de conhecimento.

"O investimento no conhecimento ultrapassa o correio eletrônico, páginas Web, intranets e groupware e chega ao desenvolvimento e à disseminação de experiências e até de sabedoria, para que todos na organização, em qualquer lugar e a qualquer momento, possam ter acesso ao conhecimento acumulado na organização e aplicar idéias do mundo todo em seus trabalhos diários".