Na
Escola Infantil todo Mundo Brinca se Você Brinca
Leni Vieira Dornelles
Agora
eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigada a ser feliz
E você era a princesa
Que eu fiz coroar
E era tão linda de se
admirar...
É comum ouvirmos queixas de pais, mães e educadores/as
que as crianças hoje em dia não sabem mais brincar. Dizem
que na hora do recreio, principalmente, só correm e brigam.
Pergunto: quem pára e brinca hoje com as crianças? Quem
as ensina a brincar?
Antigamente tínhamos a rua, os irmãos mais velhos, os
primos, os tios, os avós que nos ensinavam as brincadeiras do
seu tempo de criança. Hoje, na correria do cotidiano, quem
pára e brinca com as crianças? Isso não é
nostalgia de um tempo feliz que vivi, mas constatação que
faço na convivência com crianças educadores/as.
Muitas vezes, sem nos darmos conta disso, deixamos as crianças o
dia inteiro em frente a TV ou vídeo. Entramos nas escolas de
educação infantil (creches e pré-escolas) e no
deparamos com as crianças, o dia inteiro assistindo a TV.
Quantas vezes o seu recreio é substituído por
vídeo e TV, porque o dia está frio ou nublado? Não
seria legal convidarmos as crianças para entrarem num mundo
"mágico"? Sentar com elas num canto da sala e ouvir na penumbra,
história e lendas, canções e poemas? Ou quem sabe,
fazer bolinho de chuva e depois saboreá-lo olhando a geada pela
janela? Talvez confeccionarmos dobraduras de barcos e, pela janela,
vê-lo sumir na chuva. Podemos também, sentar num canto da
sala e bordar, costurar, fazer uma bela colcha de retalhos que
irá para cada casa para ser enfeitada pelas famílias, um
boneco de pano, um carro de lata, um fantoche...
Quantas vezes, depois de muitos dias de sol, deixamos de atravessar a
rua e ir à praça em frente à escola para rolar na
grama correr, subir na árvore, brincar na areia. Volto a
perguntar: quem pára para ver do que as crianças brincam
e como brincam? Ouvir sobre o que falam, cantam e dançam?
Certamente elas brincam, e muito.
Muitas vezes, porém, deixamos por conta das apresentadoras de TV
o ensinamento de canções, danças,
confecção de brinquedos... Por outro lado, quantas
crianças deste País têm nas ruas de suas vilas um
espaço rico de atividades, brincadeiras e jogos que não
podem ser usados na sala de aula? Quantas parlendas, atividades,
danças e canções as crianças aprendem na
rua e não podem realizá-las nem falar sobre elas no
espaço escolar?
Abrir a sala de aula para as brincadeiras do folclore rico que temos em
cada uma das diferentes regiões de nosso País, cidades,
bairros é um passo importante para entendermos as diferentes
concepções de sujeito/criança que estão
presentes no cotidiano de cada um desses lugares. Entender essas
concepções é possibilitar que vivam intensamente o
seu modo de ser criança. É compreender sua cultura, seus
valores, desejos, e, principalmente, as necessidades que têm de
compreender a realidade que as cerca através do brinquedo.
Entender suas brincadeiras é possibilitar que representem os
papéis que escolheram para brincar independente do sexo. Que
elas e eles possam brincar de casinha, boneca ou panelinhas, jogar
futebol, saltar, correr, pular e subir em árvores. Brincar de
herói ou bandido, recriando os heróis que fazem parte do
seu cotidiano, de sua sociedade.
Recriando seu mundo e o mundo que vêem representado pela TV,
pelas histórias de vida, passeios... estão
constituindo-se como sujeitos criança. Por tudo isso,
educadoras/res de crianças pequenas, precisamos reaprender a
brincar com as crianças que conosco convivem. Quando propomos
uma brincadeira, elas dificilmente se negam a brincar ou dizem -
"não gosto de brincar" - e quem não brinca se você
brinca?
Podemos convidar as crianças para brincarem de: pique-esconde;
paralítico ou pegador enfeitiçado. Descobrir com elas
quem vai ser o chefe na brincadeira através do: discordar meu
pai fez uma casa minha mãe mandou... - uni dune...-
pim-poneta...- coca-cola...- Brincar com as mãos de: trem
maluco...- parará-parati...- sabonete de listra azul...-
Descobrir o mágico de pular corda como: reloginho, - chocolate,
- um homem bateu em minha porta, - fogo-foguinho-fogão...- com
quem vai casar...- vaca amarela..., - tá pronto seu lobo?
Redescobrir parlendas como: fui no cemitério... Brincar de fita;
passa anel; - caçador; - pular carniça; -
polícia-ladrão; - sapata; - cadeirinha de
dém-dém; -cadeirinha de vidro; - jogar taco, -
cinco-marias...
Seria interessante recriar espaços para jogos espontâneos
como: canto de boneca, biblioteca, teatro, blocos de madeira...Curtir
jogos e brincadeiras de pátio como: jogos de tiro ao alvo,
boliche, corrida de saco, corrida com a colher, com empecilhos, com
limite de espaço e tempo, ovo podre, cantigas de roda...
Polícia e ladrão Brincar com palavras através de
trava-língua (o peito do Pedro... O rato roeu - O
tigre...), caça palavras, o que é - o que é, carta
enigmática, diagrama, pictograma, dominox, poesias,
paródias... ou seja, milhares de outras brincadeiras que
fazíamos quando éramos pequenos e que as crianças
recriam com cara de seu tempo. Garanto que todo mundo brinca se
você brinca.
A HISTÓRIA DO BRINCAR NOS TEMPOS
Estudos feito sobre a história da infância nos mostram que
a criança vê o mundo através do brinquedo. Para
alguns autores, o brincar e o jogar documentam como o adulto coloca-se
com relação à criança e mostram suas
concepções e representações do sujeito
criança.
O jeito de lidar, organizar, propor, respeitar e valorizar as
brincadeiras das crianças demonstram, através da
história da infância, o entendimento que se tem das
crianças. O que se observa ao longo desta narrativa é que
sempre existiram formas, jeitos e instrumentos para se brincar, como
por exemplo: a bola, roda de pena, o papagaios (pandorga), jogar
pedrinhas na água... brinquedos e formas de brincar muito
antigos.
As lendas de cucas, bichos-papões, bruxas e sacis, duendes e
feiticeiros... acompanham a infância das crianças e ainda
perpassam em seus jogos. Por sermos um País de muitos
imigrantes, muitos dos grupos que para cá vieram trouxeram
consigo e com suas crianças vários jogos e brincadeiras
de seus países de origem. Por exemplo: os jogos saquinho de
ossinhos, amarelinha, bolinha de gude, bola e pião foram
trazidos para nossa cultura pelos portugueses. Os índios que
aqui viviam nos deixaram um legado rico de brincadeiras infantis.
Certamente, o jogo, o brincar caminham juntos desde o momento que se
tem registro e lembranças de uma criança que joga e
brinca. Eles são característicos de cada momento
histórico e de cada cultura.
A criança expressa-se pelo ato lúdico e é
através desse ato que a infância carrega consigo as
brincadeiras. Elas perpetuam e renovam a cultura infantil,
desenvolvendo formas de convivência social, modificando-se e
recebendo novos conteúdos, a fim de se renovar a cada nova
geração. É pelo brincar e repetir a brincadeira
que a criança saboreia a vitória da
aquisição de um novo saber fazer, incorporando-o a cada
novo brincar.
Estão sendo incorporados aos jogos infantis os brinquedos
eletrônicos como os videogames, carros com controle remoto,
minigames... eles fazem parte das novas tecnologias do brincar.
Precisamos, enquanto educadores/ras nos debruçar sobre eles,
para que possamos compreender como as crianças constituem-se
crianças através desses novos brinquedos.
DESDE MUITO CEDO SE BRINCA
Como vimos anteriormente, sempre que se fala em crianças
pensa-se em brinquedos, brincadeiras e jogos. A brincadeira é
algo de pertence à criança, à infância.
Através do brincar a criança experimenta, organiza-se,
regula-se, constrói normas para si e para o outro. Ela cria e
recria, a cada nova brincadeira, o mundo que a cerca. O brincar
é uma forma de linguagem que a criança usa para
compreender e interagir consigo, com o outro, com o mundo.
É através do jogo e pelo brinquedo que a criança
vai constituindo-se como sujeito e organizando-se: o bebezinho aproxima
e afasta os brinquedos, olha os objetos suspensos no seu berço e
acompanha seu deslocamento, tenta pegar algo para botar na boca, tenta
acertar o brinquedo na caixa, tira e bota muitas vezes os brinquedos da
gaveta... A criança parte primeiro das brincadeiras com o seu
corpo para, aos poucos, ir diferenciando os objetos ao seu redor.
Desce muito cedo os bebês começam a conhecer o mundo. Isso
depende das relações que constituem com os que
estão à sua volta e como estes interagem com ele.
É pelo brincar que as crianças se expressam e se
comunicam. E através das brincadeiras que elas começam a
experimentar e a fazer interações com os objetos e as
pessoas que estão à sua volta.
Pai, mãe, irmãos, avós, vizinhos, educadores/as,
ou seja, todos os que o atendem, educam-no e cuidam dele devem utilizar
todos os momentos possíveis do cotidiano, como, por exemplo, os
momentos da troca, banho, alimentação... para realizarem
brincadeiras com ele. Quando se brinca de João carpinteiro, de
fazer ruídos estranhos as soprando sua barriga, flexionando suas
pernas, andando com ele sobre nossos pés, brincando de esconder
com suas cobertas... estamos, certamente, contribuindo para que as
crianças participem de maneira mais prazerosa da vida de sua
escola infantil, da vida sua casa.
Podemos, nas brincadeiras com os bebês, utilizar também
materiais e brinquedos por nós confeccionados. Podemos
confeccionar brinquedos como garrafas com líquidos coloridos,
móbiles com diferentes sons, livros de pano ou plástico,
caixas de diferentes tamanhos, tintas com anilina doce... Certamente,
na hora de interagirmos com as crianças utilizando estes e
muitos outros materiais por nós construídos, tudo vai
virar brincadeira.
Com esta forma lúdica de brincar com o corpo ou com os materiais
que estão ao alcance dos bebês, se estará
possibilitando o sugar, pegar, bater, agarrar... É
através do outro, pela sua voz, seu gesto, seu toque, sua
palavra, gesto ou canção que o bebê será
convidado a perceber, descobrir e conhecer de forma prazerosa o mundo
que o rodeia.
À medida que ele amplia suas experiências, seu corpo
já não lhe basta para as brincadeiras. À medida
que a criança cresce, as brincadeiras vão tomando uma
dimensão mais socializadora, em que os participantes se
encontram, têm uma atividade comum e aprendem a
coexistência com tudo que lhes possibilita aprender, corno o
lidar com o respeito mútuo, partilhar brinquedos, dividir
tarefas e tudo aquilo que implica urna vida coletiva.
O brincar proporciona a troca de pontos de vista diferentes, ajuda a
perceber corno os outros o vêem, auxilia a criação
de interesses comuns, urna razão para que se possa interagir com
o outro. Ele tem, em cada momento da vida criança, urna
função, um significado diferente e especial para quem
dele participa. Aos poucos, os jogos e brincadeiras vão
possibilitando às crianças a experiência de buscar
coerência e lógica nas suas ações governando
a si e ao outro. Elas passam a pensar sobre suas ações
nas brincadeiras, sobre o que falam e sentem, não só para
que os outros possam compreendê-las, mas também para que
continuem participando das brincadeiras. Aí está o
difícil e o fácil que é o brincar e o conviver com
o outro.
VAMOS BRINCAR DE REI-RAINHA?
É através do faz-de-conta que a criança tem a
possibilidade de experimentar diferentes papéis sociais que
conhece e vivencia no cotidiano de suas histórias de vida. Corno
nos fala Oliveira (1993), no brinquedo de faz-de-conta - mais do que
repetir um modelo de ação que ela observa ocorrer
envolvendo um adulto e urna criança, ela exercita um papel de
adulto, vivenciado por ela na idade adulto - criança e esta
seria também a forma de a criança poder
compreendê-lo.
Nesta forma de brincar mais do que simplesmente repetir modelos que ela
observa, exercita diferentes papéis por ela vividos em suas
relações com o outro. O que está presente no mundo
das crianças e adultos, certamente, estará presente nos
seus jogos e brincadeiras. Também fazem parte desse mundo e
dessas representações as histórias dos livros com
seus reis, rainhas e princesas. Quantas vezes ouvimos elas combinarem:
“Agora eu era o rei!" "Eu sou a rainha!" E partilham papéis que
fazem parte desse jogo imaginário de outros tempos e mundos
sonhados.
Muitas vezes o seu jogo é ocupado o tempo inteiro pela
definição de papéis (o que cada um vai ocupar na
brincadeira). Quando tudo isto se define elas passam para a montagem de
urna outra e nova brincadeira, pois o jogo mesmo era o de definir quem
vai ser o quê.
Numa brincadeira imaginária como o faz-de-conta, a
criança age corno num mundo imaginário (o avião
que pilota na brincadeira, por exemplo), a situação
estabelecida para que se brinque é (avião, piloto,
aeromoça, passageiro, vôo, comissário...) e
não os elementos reais que estão presentes (o seu quarto,
os móveis, os carrinhos, as bonecas...). Ao brincar de
faz-de-conta, a criança transforma objetos que, muitas vezes,
para nós adultos, nada tem a ver com o que ela leva nas
mãos: urna tampa de panela passa a ser o manche do avião,
ela serve corno representação de urna realidade ausente e
ajuda a criança a separar o objeto e significado. Não
há, portanto, nenhuma relação com o objeto que ela
tem na mão. Além da s situações
imaginárias vividas pela criança no seu faz-de-conta,
há também situações de regras e normas que
devem ser seguidas para que ela permaneça na brincadeira. Muitas
vezes, para dar conta dos papéis que tem que representar ela faz
um esforço imenso para atender o que lhe é imposto. Ela
sabe que, se não entra na norma, está fora da brincadeira.
As regras e normas assumidas no brincar fazem com que as
crianças se comportem de forma mais avançada daquilo que
na sua idade seria peculiar. Elas têm que se esforçar para
exibir o comportamento mais semelhante possível do real. Isso as
impulsiona, conseqüentemente, para além do seu
comportamento habitual. Executar com precisão o papel exigido no
jogo de faz-de-conta é inclusive cobrado e fiscalizado pelas
outras crianças que participam do brinquedo. É
interessante observarmos como elas constituíram socialmente "o
modelo" de ser professor/a. Neste papel, precisam mandar fazer fila,
xingar os outros, mandar fazer a tarefa..., tudo é grito, tudo
é mando. As crianças incorporam sinais
autoritários que, historicamente, têm feito parte do papel
de ser professora representado na TV, revistas em quadrinhos, filmes...
Através do faz-de-conta a criança pode, também,
reviver situações que lhe causam excitação,
alegria, medo, tristeza, raiva ou ansiedade. Elas podem neste jogo
mágico, expressar e trabalhar as fortes emoções
muitas vezes difíceis de suportar. É a partir de suas
ações nas brincadeiras que elas exploram as diferentes
representações que têm destas
situações difíceis. Assim, podem melhor
compreendê-las ou reorganizá-las. É quando ao
brincar de médico, operação,
injeção, engolir remédio com gosto “ruim", morte
do seu bichinho, da perda de uma pessoa próxima... ela pudesse
reviver no faz-de-conta, as situações talvez
traumáticas e doloridas, vividas por ela ou por um coleguinha.
Explorando-as com um certo distanciamento, talvez ela possa entender e
constituir em si o que lhe é difícil compreender na sua
vida e na do outro.
O brinquedo de faz-de-conta, normalmente, é garantido na sala de
aula, no pátio, na casa, onde a família, a educador/a
estrutura um espaço que resgate a possibilidade de se poder
brincar em pequenos grupos e longe do olhar sempre vigilante do adulto.
Espaços como cantos de fantasias e trapos; casa de boneca, canto
do cabeleireiro, garagem e tantos outros.
VAMOS BRINCAR DE ESCOLA...
Convido vocês a entrarem comigo numa sala de
educação infantil; lugar do toque, da descoberta, dos
jogos, da fala, das canções, das brincadeiras. Uma sala
de crianças pequenas contém muitos mundos, muitas
realidades. Realidades que, muitas vezes, sem serem explicitadas,
controlam e normalizam o agir espontâneo do corpo e das
ações das crianças.
Entremos na escola. O sinal toca. As filas
formam-se: de um lado as meninas, do outro os meninos. Os corpos de
diferentes sexos não podem ficar juntos. Novo portão,
este já no interior da escola. Enfileiradas, as crianças
vão para a sala ouvindo a professora: "não corram, um
atrás do outro, não brinquem, não conversem,
não cantem..." O último portão é aberto e
eis a sala de aula. Nela encontramos vários mecanismos de
controle disciplinar como: a divisão do tempo fortemente marcado
por sua rotina, o controle das atividades centrados na educadora, a
distribuição dos corpos nas mesas e nas filas, a
vigilância constante da brincadeira, do recreio. Algumas
educadoras usam um apito para controlarem o recreio. Muitas vezes, no
cotidiano da educação infantil, não suportamos a
mobilidade, a atividade constante das crianças e queremos que
elas suportem a nossa imobilidade, a nossa inércia.
Onde está o movimento da descoberta, do prazer, da alegria, da
vida, das emoções e do encantamento que rodeiam a vida de
muitas das nossas crianças? Muitas vezes damos lugar em nossas
salas de aula apenas para o controle, a privação, a
punição, a vigilância, o governo de si e do outro.
Precisamos, em muitos casos, também resgatar o espaço do
lúdico pelo lúdico, passear para curtir o que está
ao nosso redor, assistir a um filme apenas por assistir, ouvir ou
contar histórias ou teatros pelo mágico que eles
carregam, curtir uma praça para poder rolar na grama, curtir o
que é inerente a cada um desses espaços e não
apenas para chegarmos na sala e termos que desenhar o que se viu ou
ouviu, contar na hora da novidade o que as crianças mais
gostaram no passeio, contar o que aconteceu no início, meio e
fim da história, do teatro. Parece que tudo, na escola infantil,
está sendo excessivamente pedagogizado, perdendo-se a
idéia de prazer, que está inerente a cada atividade da
criança. O prazer do brincar e esquecemos que: olhar, curtir,
tocar, experimentar faz parte do ser criança, faz parte da
descoberta na infância e da construção de novos
sujeitos - criança.
QUEM TÁ A FIM DE BRINCAR ...
Não é assim que as crianças chegam umas para as
outras: "tá a fim de brincar de..."
Para uma camada da população, as crianças brincam
em seus quartos com a TV o tempo inteiro ligada, brincam com seus
games, jogam em seus computadores. Praticamente lhes é
impossível brincar na rua, subir em árvores, jogar
futebol no quintal, tomar banho no rio, usar seu botoque... Seu
brincar, como disse antes, hoje é diferente.
Hoje as grandes corporações têm tomado conta de
garantir às crianças o seu lazer, não importa de
que camada social elas provenham. Se fazem parte da camada mais pobre
da população, sempre é lançado no mercado
uma imitação do brinquedo, assim todas elas são de
alguma forma atingidas. A mídia, as novas tecnologias são
o que de mais forte incide nas brincadeiras e brinquedos das
crianças.
As grandes indústrias se deram conta do quanto as
crianças pequenas são ótimas consumidoras. Os
brinquedos industrializados tomaram-se uma mercadoria muito forte, como
tantas outras na economia de mercado. Temos em nossas crianças
um consumidor em formação, e a mídia tem se
aproveitado disso com um forte apelo à afetividade, à
aventura e ao poder. O apelo à aquisição pessoal,
a realização do "sonho de consumo" faz parte da tessitura
social em que se vive. Como aponta Andrade (1995), não só
as crianças das creches pobres estão afetas aos apelos
publicitários de consumo, mas, também seus pais que,
certamente, não têm acesso às geladeiras, carros e
casas que lhes são oferecidos diariamente. Para estas
crianças e pais sobra o resto dos outros.
Existe, na grande indústria de brinquedos, toda uma
dominação cultural, social, étnica que muitas
educadoras ainda não se deram conta e acabam fortalecendo esta
forma de pensar e induzir as crianças ao consumo.
Talvez seja o momento de resgatarmos o prazer do estar brincando junto,
afetos, solidariedades, compreensões que só as
brincadeiras com o outro podem nos proporcionar. E, nesse resgate,
buscarmos como educador/as que somos, novos modos de
educação que garantam que o brincar faz parte da
criança.
As crianças estarão a fim de brincar se lhes for
garantido na escola, na sala, no pátio, em casa ou na
praça... que os brinquedos estão à sua
disposição, ao alcance. É importante também
que se garanta um tempo para o livre brincar, pelo prazer de brincar.
Que meninos e meninas brinquem e cuidem de si e do outro nas suas
brincadeiras. Que eles/as possam brincar entendendo que, quem
está a fim de brincar, tem seu direito garantido para
fazê-la.
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